Qual a nossa relação com a beleza, com o vivo, com a vida? Como romper com uma pedagogia diretiva, cumulativa, de uma lógica de consumo e abandono, fantasiada de inovadora? Como promover aos educadores um olhar sensível, solidário, que observa para entender e conhecer?
Reconheço que falar de beleza e arte, em uma sociedade tão oprimida e com tanta desigualdades não é tarefa simples, pois corremos o risco de sermos mal interpretados como superficiais, devido aos modelos midiáticos que colocam a beleza no lugar de consumo e futilidade, mas considero que justamente por isso, seja tão urgente e necessário os estudos e pesquisas sobre esse tema nos espaços educativos.
Edgar Morin (2016) nos ajuda a pensar que ao buscarmos prazer e maravilhamento, aflora em nós o sentimento estético que nos coloca em estado alterado, que ele denomina poético, em contraponto com o prosaico, o qual considera o que é feito sem prazer nem maravilhamento. “Não por acaso que a pesquisa estética de vanguarda sempre foi e é tão combatida em todas as ditaduras” (VECCHI, 2020).
Nos últimos cinco anos, desenvolvendo projetos de formação de professores em pré-escolas, tenho observado que o investimento na formação docente se baseia, na maioria das vezes, apenas em estudos teóricos de correntes e linhas pedagógicas. Dessa forma, por mais que esteja nos lábios dos adultos o discurso de uma pedagogia democrática e libertária, o que vemos no cotidiano das escolas é um hiato entre a teoria e a prática. Talvez seja por isso que ainda reproduzimos uma educação opressora, de controle corpóreo, de submissão, fantasiada de inovadora que homogeniza, julga e discrimina adultos e crianças.
Ao observarmos as crianças no brincar livre com e na natureza reconhecemos na sutileza dos gestos, olhares e composições, a experiência “que me passa” apontada por Larossa. Tempo suspenso, estado alterado e contemplativo. Hundertwasser, arquiteto austríaco desenvolveu uma equação que nos ajuda a pensar sobre isso: Natureza + Belo = Felicidade. Para Hundertwasser, quem vive na cidade grande deveria frequentar constantemente espaços de natureza para se reabastecer e se tornar mais forte e feliz e nos convida a pensar que “quando se regressa a natureza se começa o caminho da felicidade através do belo” (apud, SOLANO)
Ao nos conectarmos com a natureza, vivemos os ciclos, a pausa, o silêncio e abrimos vazios potentes de narrativas e ancestralidade. Ampliamos nossa visão do mundo e sobre o mundo. A experiência estética, nos cria tensão, confronta razão e emoção, aguça imagens e imaginários, aflorando sensações e sentimentos. Recuperamos o corpo dos sentidos “como carne do mundo” (MERLEAU-PONTY, 1992).
É preciso trazer a teoria para a prática incentivando e promovendo espaços de formação de professores que considerem o direito a beleza e a dimensão estética como caminho para uma educação ética, como aponta Vea Vecchi:
“A formação de professores deveria não esquecer nem a beleza, nem a estética, porque corre o risco de não encontrá-la mais, de considerá-la um aspecto marginal e de não vê-la nos olhares das crianças e dos jovens que se tem em frente, anulando assim, uma possibilidade de bem estar psíquico e de esperança para o futuro”
Como promover espaço e tempo de criação, maravilhamento e escuta aos adultos, no cotidiano da escola, para que permitam que as crianças vivam às infâncias na sua inteireza?
Sabemos que a paisagem externa, amplia o horizonte para a paisagem interna, da alma. Ao documentarmos as mudanças que acontecem quando reconhecemos a beleza como direito e vivemos experiências estéticas no cotidiano da escola, lutamos contra a violência e a opressão. Por isso, acreditamos que uma formação de professores pautada numa cultura do ateliê, com e na natureza através da arte, pode ser chave para uma educação para liberdade.
Formação de Professores 07 de março de 2020, A Cultura do Ateliê,
curso-ateliê, música e filosofia ( Encontro realizado antes da Pandemia)